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Sou um aquário

De repente já levo 39 semanas de pedacinho de bosta in utero. Minha nossa Senhora Iminência! A qualquer momento podem rebentar-se-me as águas da Olívia, fechando o verão. (Eu sei que são as "águas" do fim de setembro que marcam o fim do verão ― mas o verso da letra é válido na mesma, pois o verão efectivamente vai acabar mais cedo para mim.)

Tanta coisa que já cresceu, entretanto. Tanta consulta, tanto exame realizado, tanto podcast sobre maternidade ouvido, tanta coisa lida (e já esquecida, pois cérebro de grávida), tanto receio já experienciado, tanta lágrima já corrida...

O calendário de frutas e legumes que tenho colado no frigorífico, embora já não tão pertinente nesta fase, diz-me que, com estas semanas, a Olívia terá um tamanho semelhante ao de uma pequena melancia; uma pequena melancia de pelo menos 2,5kg. A minha fruta favorita da época. Às 23 semanas, data da ecografia do segundo trimestre, a menina pesava quase meio quilo e era grande o suficiente para já não caber na fotografia ― o mesmo é dizer que, desde então, já só a conseguimos ver às postas nas ecografias. Aí, ela exibia uma espinha perfeitamente delineada, abria e fechava as mãos e ainda as punha atrás da cabeça, como que curtindo o banho quente na sopa primordial. Às 32 semanas, pesava quase 1,8kg e já estava de cabecinha para baixo. Assim se mantém até hoje, em posição óptima para nascer. A obstetra acredita que ela não passa desta semana.

Sem dúvida que as coisas tornam-se mais interessantes após as 21/22 semanas de gestação. A barriga dá o primeiro bump significativo, ficamos a saber o sexo com certeza, e ela começa a fazer-se sentir imenso, tanto que já não dá mais para estar sozinha com os meus pensamentos (sobretudo a partir das 25/26 semanas). Às 39 semanas continua hiperactiva (e soluçante) e dou graças por isso, pois é assim que sei que está vivinha da silva, a toda a hora. Eu, que nunca fui dada ao mindfulness, dou por mim a praticar o mindfetalness durante imenso tempo (é um conceito, sim), e foi numa dessas contemplações que retirei uma das primeiras lições desta experiência megalómana e alienígena: é mesmo possível amarmos alguém ainda sem o conhecermos. Os movimentos dela já obedecem a um padrão próprio e dão-me a sensação de ter peixinhos a nadar dentro de mim. Sou um aquário, como diz o Muxi. (E eu que gostava tanto de ter ido fazer uma sessão de fotos ao Oceanário... mas creio que já não vou a tempo.)

Passei os 60kg (estou agora nos ~68kg, sendo que comecei com 54kg), que era uma das poucas resoluções que eu tinha para este ano. (É a resolução de todos os anos, na verdade.) Será caso para dizer que os fins justificam os meios? Mas este peso veio com as suas nuances azuis e vermelhas: varizes e derrames vários pelas pernas e pés. Filhas da mãe, literalmente. Da mãe e da avó, que a genética é como os posts de verão no instagram sobre a praia das influencers (em que reivindicam uma como sendo a praia da sua vida): incontornável.

Os meus dedos dos pés, dei conta há dias, parecem-se agora com mini-salsichas. O meu paladar ficou bem menos exigente: uma simples massa cozida em água e sal sabe-me a uma iguaria dos trópicos. Tive e tenho apetite para tudo, felizmente; não ganhei aversão a nenhum alimento. Tive e tenho o ocasional enjoo mas nada de dramático.

A rosácea é que parece não dar tréguas. A facial exacerbou no primeiro trimestre, acalmou no segundo (com uso de tópicos) e voltou agora no terceiro, para continuar a bordar naperons escarlates nas minhas bochechas ― embora, há que dizê-lo, tenha melhorado significativamente nas últimas duas semanas. A rosácea ocular manifestou-se sempre: os meus olhos estão permanentemente secos e inflamados, o que me perturba a visão; já "ganhei" um novo quisto (um chalázio, tecnicamente falando) na pálpebra superior do olho direito, e tenho um terçolho imediatamente ao lado que para lá caminha. Indo mais para sul da fronte, os lábios estão sempre partidos, como se fossem açúcar glacé, e as mãos ficam rapidamente enrugadas quando em contacto com água. Ah e tal, «vais ficar luminosa, com uma pele radiante!»... Pois, é uma forma de ver a coisa.

Tudo neste esperão está a ser esquisito e novo e carregado de expectativa e bonito de se ver (excepto a minha cara) e de se sentir (excepto o desconforto geral, as noites insones, as hemorróidas, as pernas pesadas, a tosse crónica depois de ter apanhado covid aos 7 meses de gestação). Ela tem de vir com tudo, não é?

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